VOZ PASSIVA. 73

31-12-2016 18:36

O plano C

António Couvinha

 

Estávamos em 1974 e vivia-se a revolução de Abril.

Viéramos de vários locais como Évora, Rio de Moinhos, Estremoz e o encontro estava marcado para o Café Plátano no Redondo.

Na sala interior à volta de umas garrafas de vinho, pão e queijo, éramos uns 11 ou 12, talvez 13. Não sei bem.

Relembrando um antigo “Manifesto” publicado em 71 e um segundo apreendido pela PIDE e sobretudo o que estava mais actual, a revista PI (com letra grega) da Escola Secundária do Redondo, orientada por Manuel Calado e Armando Carmelo, propúnhamo-nos criar uma outra publicação de intervenção artística e sempre empenhada politicamente como seria de esperar na época que decorria. (O Redondo era nessa altura mais ou menos a sede da LUAR no Alentejo).

O António Telmo e o Armando Carmelo eram os mais velhos participantes neste encontro e foi precisamente o António Telmo que propôs a criação de uma revista que fosse o braço artístico, ideológico e interventivo deste grupo ali presente. Constituir-se-ia assim um grupo ou “sociedade secreta” como centro de gravidade desta produção cultural. Foi então que sugeriu que o nome do grupo e o título dessa publicação começasse pela letra C visto que, apenas com uma excepção, o António João Brito, todos os outros presentes tinham um nome começado por C.

Foi um momento com muita surpresa e alguma expectativa perante aquele olhar e sorriso misterioso que todos conhecemos do António Telmo, pois não tínhamos tomado consciência disso e além disso ele não conhecia todos os presentes. Então todos nos entreolhámos para confirmar com satisfação, que salvo a excepção do Brito, que ficou um pouco desanimado, de facto o Armando Carmelo, o Manuel Calado, o Luís Cavaco e o seu irmão .... Cavaco, o António Fernando Cabeça, o José Manuel Carvalho (Pepe), a Lídia Cascalho, o meu primo José Manuel Couvinha, eu próprio António Couvinha e até o António Telmo Carvalho Vitorino todos tínhamos um nome começado por C!

Passados esses momentos de “suspense” começámos por aventar para a mesa sugestões do que poderia vir a ser o nome dessa publicação e que além do C, por ser pela Liberdade deveria ter o nome de uma ave. Lembro-me do quase óbvio Colibri, mas houve outras propostas embora a memória não me auxilie.

Não foi formado grupo nenhum. Ele já existia, estava ali. Não foi criada nenhuma publicação, apenas uns panfletos policopiados que foram o catálogo efémero da Exposição de Pintura e Desenho que o Fernando Cabeça, o Manuel Calado e eu próprio, viríamos a realizar no Alandroal e em Sesimbra, organizada pelo António Telmo. A intervenção musical foi do Vitorino e Cantadores do Redondo. Em Sesimbra também com a participação do Zeca Afonso.

 

Évora 29/10/2016