VOZ PASSIVA. 102
ANTÓNIO TELMO, DEZ ANOS DEPOIS
Trilogia das naus
- Evocação de António Telmo
Uma década de serviço e de saudade
Eduardo Aroso
I
Estremoz foi cais de partida.
Dez naus largaram rumo
Ao que se há-de cumprir.
O lugar alarga-o a ideia
O arquétipo do poder-ser.
Dez naus levam a bordo
Pobres franciscanos do universal
Soldados de labuta, seara maior.
Desembainha-se a espada pela luz
Em cada acto eleva-se a espiral
E no meio do «plaino abandonado»
Avistam-se palpitantes cavaleiros do amor.
II
As dez naus enfrentam ainda
Precipícios e vagas de nevoeiro.
Multiplicam-se bichos e adamastores
Mas não treme ouroboros
Que permanece sempre inteiro.
O que sobrevive a ventos e marés
São os destinos-alquimias de temores.
As proas cruzam a medonha escuridão
Onde sulcos mostram promessas de azul
Eixos plenos de Oriente ao Poente
E ao mistério ainda do Cruzeiro do Sul.
III
Estremoz foi cais de partida.
Mantinha-se toda a possibilidade
Da rosa ser a seiva da pupila
No rosto com séculos de saudade.
Onde cada um chega encontra
A pedra-angular à sua espera.
E aí seguro edifica seguindo a luz
Que se torna chave das linhas astrais.
Só a palavra livre se conquistou
Perdida e achada, para ser mais.
Agosto, 2020