«OS MEUS PREFÁCIOS». 12

06-09-2017 10:15

Prefácio a Demasiado (too much), de João Fortio[1]

 

Criador de imagens pelo desenho e pela cor, de figurações em azulejos, de formas de barro, João Fortio surpreende-nos agora, depois dos cinquenta, como escritor, proeza rara nos pintores portugueses, incapazes quase sempre de seguirem o alto exemplo de Almada Negreiros. Bem se sabe que há pintores e pintores. Há aqueles que são só olhos e mãos e aqueloutros, superiores, que o pensamento ilumina e move, mãos e olhos. Como é o caso do próprio Fortio nos seus quadros, do ignorado Carlos Aurélio e do muito celebrado Espiga Pinto. Todos alentejanos, todos filhos da cólera e do amor.

O livro de João Fortio não perde na comparação com os seus quadros, os seus desenhos, os seus azulejos, ainda quando tenha nestes figurado uma Isabel de Portugal sem paralelo na vasta iconografia da Rainha Santa.

“Demasiado” não é demasiado. Lê-se, de atenção subjugada, do princípio até ao fim. O autor escreve conversando com o leitor como consigo mesmo num estilo inconfundível, contando-nos uma história que é a da própria humanidade no fim dos tempos. E, embora essa história se envolva de fantasia, é esta tão verdadeira que não podemos deixar de tomar consciência, através dela, da realidade que hoje vivemos dolorosamente na religião, no ensino e na política.

 

23 de Outubro de 2007

 

António Telmo



[1] João Fortio, Demasiado (too much), Estremoz, edição do autor, 2007, p. 3.