LANÇAMENTO DE «COISAS DE SESIMBRA», DE ANTÓNIO REIS MARQUES: A FOTO-REPORTAGEM
O Auditório Municipal Conde de Ferreira, em Sesimbra, acabou por ser pequeno para receber, na manhã de sábado, 6 de Junho, o lançamento do livro Coisas de Sesimbra, de António Reis Marques, amigo dilecto de António Telmo e membro do Projecto António Telmo. Vida e Obra. Numa sessão presidida pela anfitriã, a Presidente da Assembleia Municipal de Sesimbra, Dr.ª Odete Graça, e encerrada pelo Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra, Arq.º Augusto Pólvora, António Reis Marques proferiu tocante e vibrante discurso, de que oferecemos um excerto aos nossos leitores. A apresentação da obra esteve a cargo de Pedro Martins, que também assinou o prefácio, cujo início abaixo reproduzimos. Editado pela edilidade arrábida, Coisas de Sesimbra reúne, em mais de trezentas páginas, escritos dispersos publicados pelo autor, ao longo do último quarto de século, em diversas publicações municipais. Um verdadeiro tesouro! As fotografias que em seguida publicamos foram gentilmente cedidas pela Câmara Municipal de Sesimbra, a quem agradecemos.
«Profundamente evocativas, por mais ténues que algumas sejam, são imagens que guardo com o enternecimento que a memória costuma emprestar às primeiras coisas que os nossos olhos fixaram. Até porque, nas evocações que fazemos somos possuídos por aquela estranha sensação de estarmos presentes no meio de tantas ausências, ausências dos muitos que já desapareceram e cujas afinidades nos irmanavam.
A par disso esteve sempre presente o propósito de comunicar, de transmitir aquilo que outros nos ensinaram e que considero uma obrigação, um dever de cidadania. Porque afinal nós não somos donos ou autores de nada, mas apenas meros usufrutuários do que herdámos ou aprendemos, melhores ou piores divulgadores de conhecimentos, ressonância de ideias com origem em fontes misteriosas ou num instinto sem nome suscitador de qualquer obra que nos dignifique enquanto seres colocando nisso não só a capacidade física mas, principalmente a força anímica, a potência criadora que está na natureza de todos nós.
Assim, estaremos também de acordo com aquela sentença que nos diz “deverem os homens deixar no mundo mais testemunhos das suas vidas do que apenas os anos que tiveram de idade”.»
ANTÓNIO REIS MARQUES
«Agostinho da Silva, que nasceu no Porto, à esquina do Atlântico, e ao colo materno galgou o Douro para resgatar a Barca de Alva, descobriu em Sesimbra, rincão «com litoral de alcantil e praia, com seu castelo e seu porto, suas encostas e seus plainos, seus ocres e seus verdes, seu arreigamento no concreto e sua pronta partida para as nuvens», o perfeito resumo de Portugal. Raros, como ele, navegaram de antemão sem barca, contra a corrente indómita, contumazes ao impossível. António Reis Marques, íntimo do filósofo por cinco lustros, está entre os poucos que o acompanham. Sabe que o futuro é um rio que se sobe até à nascente, e que no lento, dissolvente desaguar da foz tudo se esbate e se perde. De resto, de que valem cursos de água a quem Deus deu a terra toda por regaço e o mar inteiro por horizonte? Por isso só os rios não correm por cá, nesta pequena pátria pintada por Agostinho. Limiar e fronteira, mesmo a alva da barca do pensador dista ainda da fonte; mas é já bem o Nascente, luz indecisa de clarão com que Midas lhe toca as águas.
António Telmo, vindo das fragas do Riba Côa, dessa adusta Almeida paredes meias com as ameias de Castelo Rodrigo, tão vizinho de Agostinho, sulcou menininho os mares do Sul para aportar ao Namibe, onde se apossou do leão que o sestro dos deuses lhe pusera nos astros; já homem feito, cruzou o oceano, desembarcou no planalto, firmou padrão em Vera Cruz; mas só em Sesimbra encontrou o barco. E deu-o por mito à legenda com que lhe leu o brasão.
O leitor, se não sabe ao que vem, terá agora de me desculpar, que eu só sei falar de António Reis Marques na igualha de homens assim, sábios e grandes como ele, e como ele guardando o segredo que o fulgor da visão lhes concedeu.
Hoje, dezasseis anos passados sobre o dia em que tive a dita de o conhecer, julgo saber um pouco desse segredo. Fui-lhe testemunhando a sabedoria a par do saber, uma generosidade tocante, a prudência firme do conselho amigo, uma lealdade sem vacilações, a hombridade que também sabe ser humilde, o estímulo poderoso de uma confiança inabalável nas gerações novas. E, sobretudo, um amor prodigioso à terra que o viu nascer.»
PEDRO MARTINS