DOS LIVROS. 76

04-09-2024 13:02


[Fazer versos naturais][1]

 

Fazer versos naturais

Que se possam conversar

Mas que escondam lá por dentro

O que não é p’ra contar.

 

Com doce cadência certa

Que fascine o pensamento

E dê som ao insonoro

E me adormeça por fora

E me desperte por dentro.

 

Cada palavra um sentido

Duas um casamento

Donde nasça o imprevisto

Como trazido num vento.

Donde nasça o nunca ouvido

Donde nasça o nunca visto.

 

E, porém, tão natural

Que, ao vê-lo, se ouça dizer

Que é coisa de trazer

Nesta vida tal e qual

Como se já se soubesse

Como se fosse o que havia

Dentro de aquele que lê

E se antes não o sabia

Acorda do que o adormece

E vê.

 

António Telmo

 

 

(Publicado eViagem a Granada seguida de Poesia, 2016)

 



[1] Nota de Risoleta C. Pinto Pedro: Só por si, este poema inédito é uma arte poética e contém alguns importantes elementos da sua concepção de Poesia: o jogo entre o revelar e o ocultar, o ritmo encantatório mas despertador de uma consciência superior, a metáfora criando sentidos inesperados e operando no mistério, a simplicidade com que se revela a complexidade, o desconhecido que se mostra sem se desvendar.